Cíntia Viviane Ventura da Silva
Carmen Argiles
Esse trabalho analisa a pertinência do acompanhamento terapêutico (AT) na rede pública do município de Pelotas/RS, mais especificamente em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS).
Considerando a criação dos CAPS como estrutura de reinserção do sujeito portador de sofrimento psíquico em seu contexto social, promovendo não só a sua qualidade de vida e de seus familiares, mas também o respeito à sua singularidade (Lei 10.216), objetivamos propor o acompanhamento terapêutico como uma ferramenta de auxílio no cuidado à saúde mental na rede pública.
O acompanhamento terapêutico surge na década de 60 através das comunidades terapêuticas, como recurso da reforma psiquiátrica e da luta antimanicomial. Sofre influências da antipsiquiatria inglesa e da psiquiatria democrática de Franco Basaglia (PITIÁ; SANTOS, 2005).
A comunidade terapêutica precursora do AT (PITIÁ; SANTOS, 2005) foi a Clínica Pinel em Porto Alegre nos anos 1960, onde era chamado de “atendente psiquiátrico”. As comunidades terapêuticas funcionavam em hospitais psiquiátricos e possuíam uma figura terapêutica que permanecia com os pacientes no dia-a-dia objetivando construir um meio social.
Silva (2005, p. 44) faz uma referência ao contexto histórico-político em que o surgimento do AT se deu
"na constituição do seu campo, o Acompanhamento Terapêutico mostrava-se como um recurso auxiliar para pacientes graves, alguns considerados 'crônicos', que ia de encontro a uma lógica que desejava
deixar a pessoa que é rotulada de louca apenas dentro dos hospitais psiquiátricos. Assim, desde sua configuração inicial o AT mostra essa ruptura com o 'modelo de saúde' que busca isolar dentro do hospício,
controlar todas as manifestações anormais para depois 'tratar' ".
Palombini (2004, p. 78) conceitua o AT “como uma clínica em ato, onde o setting é a cidade: a rua, a praça, a casa, o bar. Uma clínica em que a palavra e também o corpo, os gestos, as atitudes contam”. Ela o define como um dispositivo clínico-político (PALOMBINI, 2006).
Conforme Barretto (2005, p. 202), o AT é “uma ajuda especializada em funções que pertencem à vida mesmo. Tentamos potencializar aquilo que está, ou deveria estar, presente na vida de cada um”.
Ayub (1996, p. 40) refere que, "atualmente, o Acompanhamento Terapêutico não deve ser entendido como um trabalho exclusivo de atendimento ao paciente psicótico, podendo realizar trabalhos de integração social com indivíduos portadores de deficiências, síndromes e distúrbios do desenvolvimento. O trabalho pode ser realizado na residência do paciente, reorganizando seu espaço, interesses e as relações afetivo-familiares. Ou ainda, na rua, trabalhando o comportamento, a representação das regras sociais, interesses mais amplos e, até mesmo, o lazer simplesmente".
Para Silva (2005, p. 41), “o AT pode ser uma prática de integração, uma atividade revolucionária, uma prática de inclusão”. Ele segue falando da questão do setting, ou melhor, dos múltiplos settings em que a estratégia do AT permite ao trabalho terapêutico, afirmando que “[...] a prática do AT se dá em vários espaços, não ocorrendo apenas na cidade de concreto (mas também no quarto, na sala, na
lanchonete, no sítio, no consultório, na festa, na praia, no campo, etc.)” (SILVA, 2005, p. 80).
Dentro das possibilidades do AT ainda trazemos Lancetti (2006, p. 25-26), que nos diz que “o acompanhante na sua intimidade amigável pode conectar ao mundo, realizar agenciamentos [...] e furar o cerco” (grifo nosso).
Através de nossa pesquisa bibliográfica, em que investigamos o material científico já publicado em relação ao tema de nosso trabalho e os relatos de experiências semelhantes, entendemos que a função do AT vai ao encontro do que preconiza as atuais políticas públicas de saúde mental (Lei 10.216), trazendo ao
sujeito outras possibilidades além do asilamento/isolamento.
Percebemos ainda que as experiências com AT na rede pública alcançaram resultados positivos e de sucesso. Os sujeitos antes relegados à margem do social, hoje possuem um olhar diferenciado e um cuidado mais humano.
O estudo nos possibilitou observar a importância do acompanhamento terapêutico nos centros de atenção psicossocial. Perpassando a prática do acompanhar terapeuticamente, há permissão para o sujeito de se constituir como humano, recebendo um investimento que em muitos casos pode já haver definhado, tanto por parte dos cuidadores/familiares quanto do meio social em que vive.
Salientamos que muito ainda há para ser conquistado nesta área, porém a implantação do acompanhamento terapêutico em serviços de atenção à saúde mental na rede pública é um avanço inegável na busca por uma humanização do cuidado com o sujeito portador de sofrimento psíquico.
Concluímos que o acompanhamento terapêutico é uma proveitosa e útil ferramenta de trabalho no processo de inclusão social em vários âmbitos, podendo auxiliar de forma eficiente no tratamento das pessoas cuidadas no CAPS.
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Resumo expandido apresentado no XX Congresso de Iniciação Científica da UFPEL - 2011.
Disponível em: http://ufpel.edu.br/cic/2011/anais/pdf/CS/CS_01108.pdf
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Cíntia Viviane Ventura da Silva Acompanhamento Terapêutico XX Congresso de Iniciação Científica - 2011 - UFPEL |
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